Viver Duas Vezes: sobram razões emocionais para assistir a esse drama
Viver Duas Vezes: filme dirigido por Maria Ripoll
COMO NÃO SE EMOCIONAR COM UM FILME QUE FALA DE ALZHEIMER?
Viver Duas Vezes, filme dirigido pela espanhola Maria Ripoll em 2019, tirou do pedestal este cronista dedicado a escrever críticas e resenhas de filmes. Apertei o play disposto a fazer uma análise compenetrada, para depois desfiar minhas impressões num texto objetivo. Pensei que me manteria frio, concentrado nas técnicas cinematográficas e nos recursos narrativos. Avaliaria as atuações e as linhas de diálogo, a fotografia, a trilha sonora... Se assim tivesse feito, passaria pelo filme sem viver a imensa variedade de emoções que o enredo suscita. Mas não! Envolvi-me emocionalmente. Fiquei cego para o cinema que acontecia diante dos seus olhos!
– Ora, se é para ignorar o cinema, vá ler um romance sobre o tema – diriam com razão os cinéfilos tecnicamente engajados. Tenho que concordar. Então, só me resta emitir uma declaração de impedimento: sim, confesso que sou emocionalmente comprometido para julgar o filme Viver Duas Vezes. Fui pego de jeito pela temática e agora a minha avaliação se tornou inútil para aqueles que buscam uma opinião balizada sobre a qualidade da obra.
A senha que abriu a caixa de emoções – e que me levou às lágrimas – foi a palavra Alzheimer. A diretora Maria Ripoll manipulou o tema com sensibilidade e critério, mas mexeu num vespeiro incomensurável. O filme que ela dirigiu não foi o mesmo ao qual assisti, nem ao qual você assistiu ou assistirá. Cada espectador frui o seu próprio cinema e os realizadores não têm nenhum controle sobre isso – é claro que essa foi uma frase de efeito, pois o conceito pode se aplicar a qualquer obra de arte ou produto cultural, mas ousei escrevê-la apenas para ficar no mesmo patamar passional de quando estava diante da TV.
– Ora, se é para ignorar o cinema, vá ler um romance sobre o tema – diriam com razão os cinéfilos tecnicamente engajados. Tenho que concordar. Então, só me resta emitir uma declaração de impedimento: sim, confesso que sou emocionalmente comprometido para julgar o filme Viver Duas Vezes. Fui pego de jeito pela temática e agora a minha avaliação se tornou inútil para aqueles que buscam uma opinião balizada sobre a qualidade da obra.
A senha que abriu a caixa de emoções – e que me levou às lágrimas – foi a palavra Alzheimer. A diretora Maria Ripoll manipulou o tema com sensibilidade e critério, mas mexeu num vespeiro incomensurável. O filme que ela dirigiu não foi o mesmo ao qual assisti, nem ao qual você assistiu ou assistirá. Cada espectador frui o seu próprio cinema e os realizadores não têm nenhum controle sobre isso – é claro que essa foi uma frase de efeito, pois o conceito pode se aplicar a qualquer obra de arte ou produto cultural, mas ousei escrevê-la apenas para ficar no mesmo patamar passional de quando estava diante da TV.
O filme Viver Duas Vezes ao qual assisti escancarou uma realidade que me é familiar. O personagem Emílio, muito bem interpretado por Oscar Martinez, refletiu com minúcias os últimos dias vividos por minha mãe. O lento apagar das lembranças – primeiro as recentes e depois as antigas… O impacto na família… As confusões… A tristeza… As piadas involuntárias… A impotência.
Ludy certamente enxergou seu pai – levado há alguns anos por essa triste doença – e sua mãe, que agora convive também com ela em estágio avançado. É inevitável. Qualquer um que assista a Viver Duas Vezes e que já tenha sido colhido pelo turbilhão que é o Mal de Alzheimer, o faz em estado de comoção.
Durante o filme também tive tempo para enxergar a mim mesmo, num futuro incerto, quando enfrentarei os perigos das probabilidades genéticas que carrego comigo. Talvez lide com situações vexatórias, com a ideia de não controlar meus pensamentos, com a perda de identidade… Eventualmente darei trabalho para minha mulher, minha filha...
No filme Viver Duas Vezes, pode-se questionar o funcionamento do roteiro, que às vezes nos sonega mais detalhes sobre os personagens. Pode-se criticar o humor óbvio e previsível em algumas cenas. Pode-se reclamar do ritmo indeciso, que nos impõe sequências ora arrastadas, ora rápidas demais. Mas é assim mesmo! Um filme com temática tão emotiva só pode ter esse jeito incerto, onde tudo parece funcionar na base da tentativa e erro.
E funciona! Quando torcemos para que venha uma piada sem graça, só para quebrar a tensão, ela vem. E rimos. Quando queremos cenas óbvias, para confirmar o que já sabemos, elas fluem límpidas. E nos aliviamos. Quando nos permitimos entrar em contato com nossas emoções, há espaço. E nos entregamos.
Como percebem, sou alguém comprometido emocionalmente para comentar sobre o filme Viver Duas Vezes. E se o faço, não é por teimosia. É porque depois de algum tempo, passada a avalanche emocional, consegui refletir e encontrar algo a dizer para os cinéfilos tecnicamente engajados – e também para todos aqueles que desejam apenas curtir uma boa história bem contada. Na verdade é um apelo: por favor, contem-me o que viram e ouviram. Mostrem-me aquilo que não enxerguei porque estava ocupado demais prestando atenção no meu próprio umbigo!
Ludy certamente enxergou seu pai – levado há alguns anos por essa triste doença – e sua mãe, que agora convive também com ela em estágio avançado. É inevitável. Qualquer um que assista a Viver Duas Vezes e que já tenha sido colhido pelo turbilhão que é o Mal de Alzheimer, o faz em estado de comoção.
Durante o filme também tive tempo para enxergar a mim mesmo, num futuro incerto, quando enfrentarei os perigos das probabilidades genéticas que carrego comigo. Talvez lide com situações vexatórias, com a ideia de não controlar meus pensamentos, com a perda de identidade… Eventualmente darei trabalho para minha mulher, minha filha...
No filme Viver Duas Vezes, pode-se questionar o funcionamento do roteiro, que às vezes nos sonega mais detalhes sobre os personagens. Pode-se criticar o humor óbvio e previsível em algumas cenas. Pode-se reclamar do ritmo indeciso, que nos impõe sequências ora arrastadas, ora rápidas demais. Mas é assim mesmo! Um filme com temática tão emotiva só pode ter esse jeito incerto, onde tudo parece funcionar na base da tentativa e erro.
E funciona! Quando torcemos para que venha uma piada sem graça, só para quebrar a tensão, ela vem. E rimos. Quando queremos cenas óbvias, para confirmar o que já sabemos, elas fluem límpidas. E nos aliviamos. Quando nos permitimos entrar em contato com nossas emoções, há espaço. E nos entregamos.
Como percebem, sou alguém comprometido emocionalmente para comentar sobre o filme Viver Duas Vezes. E se o faço, não é por teimosia. É porque depois de algum tempo, passada a avalanche emocional, consegui refletir e encontrar algo a dizer para os cinéfilos tecnicamente engajados – e também para todos aqueles que desejam apenas curtir uma boa história bem contada. Na verdade é um apelo: por favor, contem-me o que viram e ouviram. Mostrem-me aquilo que não enxerguei porque estava ocupado demais prestando atenção no meu próprio umbigo!
Resenha crítica do filme Viver Duas Vezes
Ano de produção: 2019
Direção: Maria Ripoll
Roteiro: Maria Minguez
Elenco: Oscar Martínez, Inma Cuesta, Mafalda Carbonell, Nacho López, Isabel Requena, Aina Clotet, Antonio Valero, María Zamora e Hugo Balaguer
Direção: Maria Ripoll
Roteiro: Maria Minguez
Elenco: Oscar Martínez, Inma Cuesta, Mafalda Carbonell, Nacho López, Isabel Requena, Aina Clotet, Antonio Valero, María Zamora e Hugo Balaguer
Fábio, o filme é realmente muito bom. Assim como o teu post a respeito. Parabéns por mais este texto.
ResponderExcluirValeu, Jorge! Que bom que você tá gostando!
ResponderExcluirQuero ver esse filme!!!
ResponderExcluirVeja e depois me conte!
ResponderExcluirGostei de ler seu texto, Fábio ! Pela forma como escreve e pela emoção que compartilha ! Quero ler outros...e quero ver o filme !!! Abraço pra você e Ludy !
ResponderExcluirQue bom que você gostou! Obrigado pelo incentivo. Dois abraços pra você, um meu e outro da Ludy.
ResponderExcluirFabio, fiquei realmente sensibilizada com o seu comentario. Parabéns! Quero ver esse filme!
ResponderExcluirLegal, Vanilza! Espero que você goste. Depois me conte o que achou.
ResponderExcluirFábio, sou solidário com vocês. Eu estou cuidando de minha mãe que teve um avc grave que apagou todas as suas memórias e capacidade de comunicação. Faz parte do ciclo natural da vida.
ResponderExcluirEu gostaria de sugerir a vocês, sabendo da veia musical que pulsa na família, para criarem entre vocês uma memória musical da família. Sabe-se que o Alzheimer não afeta a área do cérebro que lida com essa memória musical. Há relatos de pessoas que puxam algumas memórias e reforçam laços através de canções e músicas que costumavam desfrutar juntas.
Permitam-me a intromissão. Sobre esse tema da memória musical, há um filme mais ou menos recente que me tocou muito: "A Música Nunca Parou". Recomendo este também.
ExcluirOlá, Giba. Receba também a nossa solidariedade. Sim, esse é o ciclo natural da vida e, como dizem os mais espiritualizados, estamos todos caminhando para deixá-la. Você lembrou muito bem a questão da música. De fato, Ludy e eu temos percebido que nossas mães têm uma surpreendente memória musical. Lembram das letras e das melodias e adoram cantar. Volta e meia fazemos isso, estimulando a cantoria. É uma ótima oportunidade de convívio. Vamos mais disso! Valeu!
ResponderExcluirEsse filme me pegou! Pela música lindamente colocada e cantada, pela crueldade e inocência da neta, pela paciência da filha com o pai. Chorei e ri . Meu namorado não gostou muito da interpretação de Oscar Martinez , ele acaba de perder a mãe , muito nova ainda e com esse mal, achou muito fraco , fora da realidade, talvez o momento não tenha sido adequado para rever tal assunto tão devastador . Eu achei sensível , conseguiu me emocionar de verdade.
ResponderExcluirOlha Paula, não se pode discutir sobre esse filme sem focalizar no tema da doença. É um assunto sensível, e tenho certeza de que muitas pessoas não estão preparadas para encará-lo sem preparativos. Ao contrário de outros filmes que apelam para o sentimentalismo, esse conseguiu desenvolver os personagens e apresentá-los de forma honesta e envolvente. É daí que vem toda a carga emotiva que o filme enseja. Também gostei muito.
ExcluirAcho que vi este filme..vou ver de novo. Se não me engano tem uma música conhecida. Perfídia? Agora me atiçou querer ver de novo.
ResponderExcluirAinda não revisitei esse filme. Talvez a experiência seja reveladora. Ressaltará alguns defeitos, revelará novos detalhes... Sem a carga emocional, enxergarei melhor o cinema.
Excluir