Uma História Real: filme de David Lynch
Direção: David Lynch
VERDADEIRA, EMOCIONANTE E CONTADA COM SENSIBILIDADE
A velhice. Por que demoramos tanto para encará-la nos olhos? Ela recebe nosso desprezo por décadas, mas é irredutível. Fica lá, à espreita, enquanto fazemos de conta que não é com a gente. Tem tanto a dizer, mas nos fazemos de surdos. Quando a enxergamos num relance, ela está tão distante que não conseguimos vê-la com nitidez – temos as lentes embaçadas de aqui e agora. Com o envelhecer, acontece o oposto! Ele está sempre ao nosso lado. Ele nos ensina, enaltece nosso amadurecimento, estimula nosso aprendizado. Mesmo quando fazemos seis anos de idade e sopramos a vela em cima do bolo, ele está lá para lembrar que agora já não temos mais cinco anos... Já podemos ocupar uma carteira na turma do primeiro ano!
A velhice, não! É uma tutora ausente. A danada demora para dar as caras, mas quando chega, é de repente. Chega para se impor, autoritária, sem compaixão e sem escrúpulos. O que mais surpreende na velhice é que ela vem com uma lentidão absurda, como se viesse montada num veículo tão lento que até mesmo um sujeito a pé seria capaz de ultrapassá-la. Essa bela imagem poética da velhice está toda lá, registrada em cinema por David Lynch, em seu filme Uma História Real, de 1999.
Ao assistir a essa obra sensível e delicada, é de se perguntar: quanto lirismo é possível adicionar a uma história, antes que ela desande em pieguice? A que profundidade emocional se consegue mergulhar, para lidar com personagens que apenas surgem e desaparecem na estrada? Como obter o sumo da originalidade ao se espremer metáforas banais? David Lynch encontrou a resposta. Em Uma História Real ele narra a jornada do velho Alvin Straight por centenas de quilômetros montado em um reles cortador de grama, apenas para rever o irmão.
Uma sinopse do filme talvez nem precisasse de mais palavras, ainda assim vale pena entrar em detalhes. Alvin Straight (Richard Farnsworth) é um homem de 73 anos que já não está tão bem de saúde. Vive em Laurens, Iowa, com a filha Rose (Sissy Spacek). Descobre que seu irmão, Lyle (Harry Dean Stanton), com quem não conversa há anos, desde que se desentenderam, sofreu um derrame. Alvin deseja visitá-lo, mas há um problema: o irmão mora em Mount Zion, no Wisconsin, a centenas de quilômetros. Ele decide que fará a jornada em um velho cortador de grama, com alguns pertences numa pequena carreta a reboque. Isso torna a viagem muito mais demorada e penosa. Mas talvez seja esse mesmo o desejo de Alvin: pagar a pena por seus erros do passado. La se vai ele, pelo acostamento, dia após dia. Cruza com pessoas as mais diferentes, troca experiências com elas e vive os seus dias de velhice.
A velhice, não! É uma tutora ausente. A danada demora para dar as caras, mas quando chega, é de repente. Chega para se impor, autoritária, sem compaixão e sem escrúpulos. O que mais surpreende na velhice é que ela vem com uma lentidão absurda, como se viesse montada num veículo tão lento que até mesmo um sujeito a pé seria capaz de ultrapassá-la. Essa bela imagem poética da velhice está toda lá, registrada em cinema por David Lynch, em seu filme Uma História Real, de 1999.
Ao assistir a essa obra sensível e delicada, é de se perguntar: quanto lirismo é possível adicionar a uma história, antes que ela desande em pieguice? A que profundidade emocional se consegue mergulhar, para lidar com personagens que apenas surgem e desaparecem na estrada? Como obter o sumo da originalidade ao se espremer metáforas banais? David Lynch encontrou a resposta. Em Uma História Real ele narra a jornada do velho Alvin Straight por centenas de quilômetros montado em um reles cortador de grama, apenas para rever o irmão.
Uma sinopse do filme talvez nem precisasse de mais palavras, ainda assim vale pena entrar em detalhes. Alvin Straight (Richard Farnsworth) é um homem de 73 anos que já não está tão bem de saúde. Vive em Laurens, Iowa, com a filha Rose (Sissy Spacek). Descobre que seu irmão, Lyle (Harry Dean Stanton), com quem não conversa há anos, desde que se desentenderam, sofreu um derrame. Alvin deseja visitá-lo, mas há um problema: o irmão mora em Mount Zion, no Wisconsin, a centenas de quilômetros. Ele decide que fará a jornada em um velho cortador de grama, com alguns pertences numa pequena carreta a reboque. Isso torna a viagem muito mais demorada e penosa. Mas talvez seja esse mesmo o desejo de Alvin: pagar a pena por seus erros do passado. La se vai ele, pelo acostamento, dia após dia. Cruza com pessoas as mais diferentes, troca experiências com elas e vive os seus dias de velhice.
Uma História Real é baseado em uma história... real! A roteirista e produtora Mary Sweeney, que já trabalhara com David Lynch em seus filmes anteriores, leu sobre Alvin Straight e sua jornada num artigo do New York Times. Entrou em contato com o autor e conseguiu os direitos da história. Porém, Alvin Straight morreu antes que ela pudesse escrever um roteiro. Ela então estabeleceu uma colaboração com outro roteirista, John Roach. Ambos trabalharam arduamente, para entrevistar parentes e amigos. Chegaram a percorrer todo o trajeto feito por Alvin. Levantaram informações suficientes para construir sua história.
Concluído o roteiro, David Lynch gostou tanto do resultado que decidiu filmá-lo. Na filmografia do diretor, este provavelmente é o único roteiro que não sofreu interferência dele. Também é o único filme dele que não recebeu restrições de exibição e pôde ser liberado para todas as faixas etárias – inclusive foi distribuído pela... Disney! É importante que se diga: ainda que o talento de David Lynch e sua sensibilidade artística ocupem a tela, o excelente trabalho realizado pelos roteiristas Mary Sweeney e John Roach ampliou a qualidade do filme.
Outro aspecto memorável do filme é a sua trilha sonora, espetacular - talvez não seja essa a palavra certa, mas é a que me ocorre para expressar o quanto as canções do filme martelam na cabeça depois que ele termina. O ator Richard Farnsworth é outra força motriz do filme. Expressivo e carismático, trouxe autenticidade para o personagem e soube construí-lo sobre uma base de sentimentalismo, sem exageros. Ele foi indicado para o Óscar de melhor ator – perdeu para o Kevin Spacey de Beleza Americana.
Para concluir meus elogios a esse filme poético e sensível, que tem doses certas de melancolia e passagens bem humoradas, terei que fazer um malabarismo para não dar spoilers. Quero mencionar a cena final de Uma História Real, mais precisamente a palavra “Sim” – a última pronunciada antes de rolarem os créditos finais – que é dada como resposta por Alvin Straight ao ser perguntado pelo irmão se ele veio lá do Iowa montado naquele reles cortador de grama. Nesse momento, ao ver a reação dos dois irmãos, caímos em epifania. Como é possível que uma história tão simples, contada sem floreios, consiga provocar tamanho encantamento? Ora... graças à sensibilidade e à profundidade artística de David Lynch!
Concluído o roteiro, David Lynch gostou tanto do resultado que decidiu filmá-lo. Na filmografia do diretor, este provavelmente é o único roteiro que não sofreu interferência dele. Também é o único filme dele que não recebeu restrições de exibição e pôde ser liberado para todas as faixas etárias – inclusive foi distribuído pela... Disney! É importante que se diga: ainda que o talento de David Lynch e sua sensibilidade artística ocupem a tela, o excelente trabalho realizado pelos roteiristas Mary Sweeney e John Roach ampliou a qualidade do filme.
Outro aspecto memorável do filme é a sua trilha sonora, espetacular - talvez não seja essa a palavra certa, mas é a que me ocorre para expressar o quanto as canções do filme martelam na cabeça depois que ele termina. O ator Richard Farnsworth é outra força motriz do filme. Expressivo e carismático, trouxe autenticidade para o personagem e soube construí-lo sobre uma base de sentimentalismo, sem exageros. Ele foi indicado para o Óscar de melhor ator – perdeu para o Kevin Spacey de Beleza Americana.
Para concluir meus elogios a esse filme poético e sensível, que tem doses certas de melancolia e passagens bem humoradas, terei que fazer um malabarismo para não dar spoilers. Quero mencionar a cena final de Uma História Real, mais precisamente a palavra “Sim” – a última pronunciada antes de rolarem os créditos finais – que é dada como resposta por Alvin Straight ao ser perguntado pelo irmão se ele veio lá do Iowa montado naquele reles cortador de grama. Nesse momento, ao ver a reação dos dois irmãos, caímos em epifania. Como é possível que uma história tão simples, contada sem floreios, consiga provocar tamanho encantamento? Ora... graças à sensibilidade e à profundidade artística de David Lynch!
Resenha crítica do filme Uma História Real
Título original: The Straight StoryTítulo em Portugal: Uma História Simples
Ano de Produção: 1999
Direção: David Lynch
Roteiro: Mary Sweeney e John Roach
Elenco: Richard Farnsworth, Sissy Spacek, Harry Dean Stanton, Jane Galloway Heitz, Joseph Carpenter, Donald Wiegert, Ed Grennan, Jack Walsh, James Cada, Wiley Harker, Kevin Farley, John P. Farley, Anastasia Webb, Barbara E. Robertson, John Lordan, Everett McGill e Dan Flannery
Delícia de texto! Proporciona uma leitura leve e inteligente.
ResponderExcluirLegal, Edinho do Monte! Muito obrigado pelo feedback! Valeu!
ExcluirÉ uma história emocionante mas, comentada por vc, fica super emocionante!!!😍😍😍😍😍😍😍😍
ResponderExcluirValeu! Grato pelo comentário!
ExcluirFilme e história maravilhosos. Quanta sensibilidade e capricho de todos os envolvidos. E você Fabio, merece um grande abraço por essa crônica tão sensível quanto o filme é a história.
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