O Vôo da Fênix: sobrevivendo à queda no deserto de Gobi

Cena do filme O Vôo da Fênix
O Vôo da Fênix: filme dirigido por John Moore

A HISTÓRIA RENASCE DAS CINZAS, MAS O REMAKE VOA RASANTE

Quando era garoto, assisti ao filme O Vôo da Fênix original, realizado em 1965 por Robert Aldrich. Meu pai, deitado no sofá, com seu cachimbo soltando fumaça e os olhos grudados na tela da TV em preto e branco. Eu, esparramado no chão, aproveitava cada momento na companhia dele, enquanto tentava adivinhar como James Stewart, Richard Attenborough e Ernest Borgnine escapariam daquele deserto. Por meio desse filme descobri que existiam aeromodelos. Aprendi também que, na mitologia grega, havia uma ave capaz de renascer das próprias cinzas.
        O filme foi baseado no romance escrito pelo inglês Elleston Trevor, intitulado The Flight of the Phoenix, onde ele cria uma situação de estresse e a utiliza como laboratório para revelar as nuances do comportamento humano. Seus personagens em conflito vão ao limite para tentar sobreviver. Raiva, medo, fome, sede, desconfiança... Mas então vem a engenhosidade, a esperança, coragem, liderança, espírito de equipe... O autor criou uma trama com altíssimo potencial para ser adaptado para as telas. E rendeu duas versões!
        Quando lançaram a versão de 2004, dirigida por John Moore, achei que reviveria as mesmas emoções daquela noite inesquecível. Que nada! Ao invés de um drama denso e envolvente, o que vi foi um filme de ação mais interessado em oferecer entretenimento. O remake só serviu para mostrar como, depois de adulto, fiquei bem mais exigente com o cinema.
        Nessa nova versão de O Vôo da Fênix, acompanhamos a história de como o capitão Frank Towns (Dennis Quaid) e seu co-piloto A.J. (Tyrese Gibson) chegam a um poço de petróleo na Mongólia, para encerrar suas operações e levar a equipe de petroleiros para Pequim. Levam também o viajante solitário Elliot (Giovanni Ribisi), que estava com a equipe da plataforma. Carregados com ferragens, ferramentas e equipamentos, partem sobrevoando o deserto de Gobi, mas são colhidos por uma tempestade. O avião se espatifa no solo fazendo vítimas fatais. Os sobreviventes logo percebem que têm pouca chance de serem resgatados, mas são estimulados pelo misterioso Elliot, que se diz um projetista de aeronaves. Resolvem fazer o impossível: reconstruir o avião, como única opção para sobreviver e escapar de volta à civilização. Tal situação de sobrevivência faz aflorar dilemas éticos e morais, que revelam o caráter de cada um e expõem suas inclinações para o egoísmo e para o altruísmo. Os espíritos de liderança e a capacidade de trabalhar em equipe também são colocados à prova diante dos imprevistos e dos muitos perigos que surgem.
        Para realizar este novo O Vôo da Fênix, os produtores partiram do roteiro original escrito por Lukas Heller e entregaram o projeto nas mãos do diretor John Moore – cineasta com experiência em filmes de ação. Ele trabalhou com o roteirista Scott Frank, para estruturar algumas mudanças na trama. Mais adiante, convocou Edward Burns, ator e roteirista conhecido por suas habilidades em lidar com diálogos, para burilar o roteiro. Depois de três tratamentos, a história recebeu algumas alterações: o personagem do capitão Frank Towns, que no filme original fazia parte da equipe, foi transformado no homem que veio para desmantelar o time e fechar a plataforma de petróleo. Isso trouxe um elemento de conflito mais apropriado para um filme de ação.
        O diretor John Moore rodou O Vôo da Fênix sem assistir ao filme original. Tudo o que fez foi ver algumas cenas esparsas na TV. Preferiu não se deixar contaminar pelo trabalho de Robert Aldrich, pois acreditava que as comparações com um clássico do cinema jamais lhe seriam favoráveis. É compreensível, principalmente para quem tinha a clara intenção de realizar um filme de ação, onde o mundo interno dos personagens passa a ter menos importância do que as forças externas que os impele na direção do conflito.
        Este novo O Vôo da Fênix foi realizado na raça, isto é, sem abusar dos recursos da computação gráfica. As cenas do acidente aéreo foram feitas com o uso de maquetes, mas com grande apuro técnico, o que conferiu realismo ao filme. E assim como na produção de 1965, os realizadores construíram um modelo em escala real do Fênix, mas tiveram que usar um outro avião como dublê, na hora de fazê-lo voar.
        O fato é que, quatro décadas depois, a história do avião que renasce das cinzas continua funcionando. Tem um elenco carismático e elementos narrativos que oferecem bons momentos de emoção e suspense. Mas, ao invés de subir um degrau, aproveitando o potencial dramático do roteiro
, para conferir densidade aos personagens que lutam para sobreviver, os realizadores desceram ao nível da ação pura.
        O Vôo da Fênix é uma boa peça de entretenimento. Um filme ao qual assisti com certa satisfação, pois ao revisitar sua ótima história, resgatei boas memórias afetivas.

Resenha crítica do filme O Vôo da Fênix

Ano de produção: 2004
Direção: John Moore
Roteiro: Scott Frank, Edward Burns e Lukas Heller
Elenco: Dennis Quaid, Tyrese Gibson, Giovanni Ribisi, Elliott, Miranda Otto, Tony Curran, Kirk Jones, Jacob Vargas, Hugh Laurie, Scott Michael Campbell, Kevork Malikyan, Jared Padalecki, Paul Ditchfield, Martin Hindy, Bob Brown e Anthony Wong

Comentários

  1. Vi esse filme , o primeiro, no cinema , e o nome do cinema era CINE FÊNIX, NA AV. VERGUEIRO EM SÃO PAULO, EM 1965 OU 1966, que saudades .

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. O cinema sempre consegue se misturar com nossas memórias afetivas. É assim que as emoções e as sensações terminan ampliadas.

      Excluir
    2. O cinema sempre consegue se misturar com nossas memórias afetivas. É assim que as emoções e as sensações terminan ampliadas.

      Excluir

Postar um comentário

Confira também:

Menina de Ouro: a história de Maggie Fitzgerald é real?

Tempestade Infinita: drama real de resiliência e superação

Siga a Crônica de Cinema