Ventos da Liberdade: escapando do comunismo a bordo de um balão caseiro

Cena do filme Ventos da Liberdade
Ventos da Liberdade: filme dirigido por Michael Herbig

ELES JÁ PERDERAM A LIBERDADE, AGORA NÃO TÊM MAIS NADA A PERDER

Para fugir da asfixiante ditadura comunista da Alemanha Oriental, duas famílias armam um plano desesperado: por um ano e meio trabalham em segredo, construindo um balão caseiro que os levará por sobre a fronteira ultravigiada. Porém, o aparato estatal não poupa recursos para impedi-las. Dito assim, de forma concisa, pode parecer que se trata de um rompante aventureiro. Nada disso! A história é real. E agora, caro leitor, pare e reflita: o quão desesperado estará um pai de família a ponto de arriscar a vida dos próprios filhos? Colocá-los em um frágil cesto, erguê-los por um balão de tecido que ele mesmo costurou, submetê-los às forças imprevisíveis do vento e torná-los alvo de atiradores estatizados! Há muito mais em jogo que o mero anseio por aventura. Há a certeza de que sem liberdade, valor fundamental para o ser humano, não vale a pena viver.
        Essa história emblemática aconteceu em 1979 e em 1982 virou filme produzido pela Disney, intitulado Dramática Travessia e dirigido por Delbert Mann. Já esse remake realizado em 2018 recebeu o título de Ventos da Liberdade, e foi dirigido pelo alemão Michael Herbig, que se esforçou para recontar a história de uma perspectiva menos americanizada e mais direcionada ao público jovem 
 que já não faz ideia de como era a vida atrás da cortina de ferro. O diretor foi além: realizou um filme eletrizante, onde o clima de suspense é de deixar inquieto na poltrona.
        Nessa história real e bastante conhecida, a fúria totalitarista é surreal. Peter Strelzyk (Friedrich Mücke) e Günter Wetzel (David Kross) são dois pais de família. O primeiro, um mecânico e eletricista, o outro, um pedreiro. Em 1978 ambos envolveram suas famílias num plano minucioso: deixar absolutamente tudo para trás e escapar para o ocidente num frágil balão de ar quente. Mas nada acontece como planejado. Complicações imprevistas, ações impetuosas das crianças e adolescentes, medos e inseguranças, reviravoltas dramáticas... A primeira tentativa fracassa e acaba levando o implacável Tenente Coronel Seidel (Thomas Kretschmann) a iniciar uma investigação. As duas famílias trabalham na surdina para enganar a Stasi, a temida polícia secreta da Alemanha Oriental, enquanto driblam os vizinhos delatores e sempre vigilantes. Contam com criatividade, determinação e muita sorte.
        Com Michael Herbig na direção, Ventos da Liberdade resultou num thriller ágil e tenso, que mistura drama pessoal com boas doses de ação policial. E esse, caro cinéfilo, é outro elemento surpreendente nesse filme. Isso porque o diretor que o realizou fez sua fama na Alemanha como um... humorista! Ninguém poderia esperar que um ator conhecido pelas piadas escrachadas pudesse dar conta de uma história tão séria e tensa.
        O primeiro passo de Herbig foi adquirir da Disney os direitos da história para realizar o remake. Depois, colheu depoimentos minuciosos das famílias Strelzyk e Wetzel e revirou os arquivos da Stasi em busca de detalhes. Os roteiristas Thilo Röscheisen e Kit Hopkins escreveram as primeiras versões do roteiro, que foram trabalhadas posteriormente pelo diretor, definindo as linhas de diálogo e incorporando elementos dramáticos que pudessem agregar autenticidade ao filme. Herbig considerava a versão de 1982 um tanto superficial e desejava levar ao público internacional um retrato mais fiel da vida que se levava na RDA.
        O roteiro de Ventos da Liberdade é simples, mas bem construído. Privilegiou o suspense e manteve o foco na ação externa, evitando aprofundar o drama psicológico dos personagens. Tecnicamente bem realizado, é um filme onde a direção, a edição e o ritmo – pontuado por uma ótima trilha sonora – são os elementos de destaque. O trabalho dos atores ficou prejudicado em algumas cenas, quando o texto enveredou por terrenos mais didáticos e ficou a dever em profundidade emocional. Mas é preciso que se diga: a história é bem contada!
        Ao final de Ventos da Liberdade, o que nos assombra é constatar como, naquele verão de 1979, o estado comunista da Alemanha Oriental despendeu vultosos recursos, humanos e financeiros, com o fútil objetivo de impedir que oitos pessoas, entre adultos e crianças, atravessassem a fronteira e ganhassem a liberdade. Dez anos depois, o muro de Berlim cairia, fazendo com que essa história de autoritarismo ficasse ainda mais absurda!

Resenha crítica do filme Ventos da Liberdade

Ano de produção: 2018
Direção: Michael Herbig
Roteiro: Thilo Röscheisen, Kit Hopkins e Michael Herbig
Elenco: Alicia von Rittberg, David Kross, Friedrich Mücke, Karoline Schuch, Thomas Kretschmann, Christian Näthe, Emily Kusche, Jonas Holdenrieder, Sebastian Hülk, Till Patz, Tilman Döbler e Ulrich Brandhoff

Comentários

  1. Lelia Moreira da Frota07/01/2024, 10:57

    Vimos, Ventos da Liberdade ,ontem na Netflix .Muito obrigada pela belíssima crônica !

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    Respostas
    1. Ah, Lelia, muito obrigado pelo seu feedback. É um grande incentivo para seguir escrevendo. Abraços!

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