Tempestade Infinita: drama real de resiliência e superação

Tempestade Infinita: direção de Małgorzata Szumowska e Michał Englert

AQUI, A TORMENTA DEVASTA O MUNDO INTERNO DOS PERSONAGENS

Eis aqui uma estampa poderosa: Naomi Watts a encarar as forças da natureza com um misto de assombro e destemor. Ela tem estofo para promover qualquer filme de sobrevivência. Já a vimos fazendo isso em O Impossível, onde interpreta a protagonista de uma incrível história real. Agora, em Tempestade Infinita, dirigido em 2022 por Małgorzata Szumowska e Michał Englert, a atriz repete a dose. Mas se você pensa que a verá em luta contra forças externas, dessa vez poderá se frustrar. Aqui, a batalha é bem mais intimista e ocorre no campo interno, entre as várias camadas psicológicas de uma personagem solitária e atormentada.
        Sim, a história que acompanhamos em Tempestade Infinita é real. Aconteceu com Pam Bales, uma experiente enfermeira e guia, que atua como voluntária na equipe de buscas e resgate das White Mountais, em New Hampshire. Em 2010, quando escalava o Monte Washington, ela enfrentou uma forte tempestade que a obrigou a retornar. No caminho, deparou-se com um misterioso homem, que estava lá, naquelas brancuras gélidas, com o firme propósito de não sobreviver. Graças ao preparo técnico de Pam, sua determinação e bravura, ela enfrentou a tempestade e completou uma missão de resgate que se tornou a mais importante da sua vida.

        Essa história veio a público num artigo escrito em 2019 por Ty Gagne, jornalista da revista Reader’s Digest. Apesar da abordagem jornalística, o autor se concentrou nos aspectos da luta pela sobrevivência e revelou muito da dimensão emocional do evento. O ator Josh Rollins, ansioso para abraçar a carreira de roteirista, leu o artigo e correu para conseguir os direitos de adaptação para as telas. Acostumado a caminhar pelas White Mountains, onde fez várias visitas guiadas, Rollins se sentiu em casa para escrever. Vamos ver como ficou a sinopse do filme:

        Pam Bales (Naomi Watts), bem equipada e preparada, parte para sua escalada assim que o dia amanhece. A tempestade surge e a obriga a antecipar a volta. É quando percebe pegadas na neve, feitas por um reles par de tênis! Seu instinto de socorrista a leva a procurar pelo tal inconsequente, o que não a impede de enfrentar duros percalços. Ao encontrar o sujeito (Billy Howle), ele está atordoado e disposto a não se identificar. Ela passa a chamá-lo de John e assume para si a missão de reconduzi-lo em segurança até o estacionamento do parque. Será uma longa e difícil descida de seis horas, sob condições severas e potencialmente mortais. É pela interação entre os dois personagens que veremos surgir outras motivações além do instinto de sobrevivência. Ambos têm passados trágicos que precisam superar, mas estão em lados opostos. Ele, decidido a não sobreviver. Ela, agarrada ao único sentido que encontra para continuar viva.

        Nos primeiros tratamentos do roteiro, a vida da protagonista era abordada com maior amplitude, para mostrar os outros salvamentos heroicos que ela já havia realizado em sua vida profissional. O conceito do filme amadureceu e o roteiro ficou mais objetivo, fechado nas poucas horas em que toda a ação ocorreu. Depois de várias entrevistas com Pam Bales, Josh Rollins percebeu que a tragédia pessoal marcada pela perda de suas duas filhas, ainda pequenas, havia deixado marcas profundas em sua personalidade. Num trágico acidente, as meninas sucumbiram enquanto dormiam, sufocadas por um vazamento de gás. Ao conseguir atravessar essa triste tormenta de culpa e arrependimento, Tempestade Infinita vai na direção de um final edificante e profundamente emocional.
        Os traços subentendidos dessa história atraíram o interesse da atriz e produtora Naomi Watts. Ela percebeu a oportunidade de assumir um papel com grande intensidade dramática, ao mesmo tempo identificado com a coragem e a resiliência que construíram sua imagem em outros filmes. Para dirigir Tempestade Infinita, ela escolheu a polonesa Małgorzata Szumowska, uma premiada cineasta, roteirista e produtora, cujos filmes sempre se saem bem nos festivais de cinema – Em Nome de..., por exemplo, venceu o de Berlim!
        A diretora conheceu a história apenas ao receber o roteiro e só então descobriu que era baseada em fatos. Chamou seu colaborador de longa data, o roteirista e diretor de fotografia Michał Englert, para tomar parte no projeto. Aqui ele assina a fotografia e ajuda a transformar o imperativo da paisagem em um virtual personagem do filme. Fez um ótimo trabalho, a ponto de ser mencionado nos créditos como codiretor.

        As filmagens foram difíceis, em locações na Eslovênia, mais precisamente no vale Kaminska Bistrica, em Kamnik. De beleza comparável às White Mountains, o cenário foi explorado com oportunismo, mas precisou ser incrementado com as barulhentas máquinas para simular tempestades, o que produziu o necessário clima de estresse que deve estar presente em qualquer filme de sobrevivência.
        Tempestade Infinita é um filme enxuto, com um ritmo narrativo contido. Não cai nas armadilhas do gênero. Evita o sentimentalismo barato e o excesso de desastres naturais, que servem apenas para banalizar as cenas de ação. O objetivo é investigar os personagens, suas dores emocionais e o difícil processo de cura pelo qual passam. Porém, este cinéfilo exigente notou falta de um ingrediente importante: poesia! Talvez um cineasta com sensibilidades mais artísticas trilhasse caminhos que os diretores poloneses não conseguiram encontrar. O que não diminui os acertos do filme.

Resenha crítica do filme Tempestade Infinita

Título original: Infinite Storm
Ano de produção: 2022
Direção: Małgorzata Szumowska e Michał Englert
Roteiro: Josh Rollins
Elenco: Naomi Watts, Billy Howle, Denis O'Hare, Parker Sawyers, Eliot Sumner e Josh Rollins