Kramer vs. Kramer: o mais importante acontece fora dos tribunais

Cena do filme Kramer vs. Kramer
Kramer vs. Kramer: direção de Robert Benton

AUTOAPRENDIZADO INTENSIVO

Quando foi lançado, em 1979, Kramer vs. Kramer, dirigido por Robert Benton, alcançou grande sucesso junto à crítica e também ao público. Na festa do Óscar, arrebatou cinco estatuetas: melhor filme, melhor diretor, melhor ator, melhor atriz coadjuvante e melhor roteiro adaptado. Entrou para a história do cinema como uma unanimidade e continua lá, na prateleira, acumulando pó. Passados 45 anos, pode ser encontrado vagando pelos serviços de streaming, à espera de espectadores que ousem apertar o play.
        Se você é daqueles que, como eu, assistiu ao filme na época do lançamento e nunca mais se lembrou de visitá-lo, sugiro que o faça. Fiz isso há dias e constatei: Kramer vs. Kramer envelheceu muito bem! Talvez você se lembre dele como um... filme de tribunal, mas não é bem assim. Apesar do que sugere o título, trata-se de um filme sobre amadurecimento, de um pai, de uma mãe e de um filho, que tentam renascer dos cacos de uma família fraturada, para encontrar o rumo e seguir a jornada com dignidade e esperança.
        Sim, você ainda vai se deparar com atuações consistentes. No caso de Dustin Hoffman, talvez a sua melhor. No caso de Meryl Streep, magnética como sempre. No caso do pequeno Justin Henry, um achado! Também vai se deparar com um roteiro preciso, com linhas de diálogo impecáveis – até mesmo aquelas construídas no calor das improvisações durante as filmagens. Com um ritmo bem marcado, uma trilha sonora pertinente e uma atmosfera de sobriedade, Kramer vs. Kramer merece estar entre os grandes clássicos do cinema.
        A direção de Robert Benton é segura e exala personalidade. Jamais escorrega para o melodrama e está sempre focado naquilo que de fato interessa: a alma dos seus personagens. O vemos aqui exercitando seu estilo original, que alcançaria a máxima expressão em Um Lugar no Coração, outro filme seu que está entre as unanimidades. Percebemos que o diretor se coloca, ele próprio, na posição de observador e segue comovido, tentando acompanhar e compreender as motivações dos personagens. Apenas reage. Tem o bom senso de não intervir, criando suspense ou nos fazendo embarcar em suposições. Nos deixa à vontade, para exercitar nossas empatias, simpatias e antipatias.
        Para os que ainda não assistiram a Kramer vs. Kramer, vale a pena desfiar uma rápida sinopse. O filme conta a história de Ted Kramer (Dustin Hoffman), um jovem e ambicioso publicitário que trabalha na meca da profissão: uma grande agência instalada em Manhattan. Inebriado com o sucesso da própria carreira, ele chega em casa sem se dar conta de que a vida está lhe dando um nó. Vê sua mulher, Joanna (Meryl Streep), o deixar, sem mais nem menos. Ela sai de casa para não voltar e abandona com ele o filho Billy (Justin Henry), de apenas cinco anos. Ted é talentoso para os negócios, mas um inepto para cuidar do pequeno Billy. Sabe quase nada sobre o que é ser um pai presente, mas não lhe falta amor pelo filho. O que acompanharemos então é a curva de aprendizado de ambos. Ted escolhendo criar seu filho e Billy tentando se agarrar à nova realidade sem a mãe. Como podemos intuir pelo título, Joanna retornará para reclamar a guarda do filho nos tribunais, causando nova reviravolta.
        Em Kramer vs. Kramer, os procedimentos legais e os embaraços jurídicos são meras decorrências da vida em sociedade, que precisam ser – e serão – vencidas. O que nos agarra a atenção e nos comove são os pequenos lampejos de cotidiano que vão iluminando as vidas de Ted e Billy, enquanto seguem uma inevitável jornada de descobertas. No centro de tudo, há o amor. Pai, mãe e filho são papeis que os personagens vão aprendendo a desempenhar, pisando em erros e acertos, tendo que encontrar disposição, coragem e boa vontade.
        Como roteirista, Robert Benton soube desbastar o romance de Avery Corman – lançado em 1977 com o mesmo título do filme. Trouxe para as telas uma adaptação eficiente, que funcionou como veículo para que o elenco pudesse se esbaldar em sua arte. Dustin Hoffman e Meryl Streep fizeram a maior parte do trabalho pesado, mas é preciso lembrar que se trata de cinema, e não de teatro. O diretor, portanto, tem méritos de sobra. No comando, ele esbanjou competência, sensibilidade e sutileza.
        Há 45 anos, casais que se atreviam a recorrer ao divórcio, precisavam enveredar por longas discussões – ouvindo palpites de todo lado – sobre as inevitáveis consequências desastrosas para os filhos pequenos. As mulheres também eram mais propensas a assumir para si a responsabilidade de criar os filhos, sem que houvessem questionamentos. Os comportamentos mudaram e tais polêmicas perderam a força. Assistindo hoje a Kramer vs. Kramer, percebemos que elas nem sequer estão no centro da discussão. São questões periféricas, que talvez passem despercebidas pelo espectador atual.
        O que o filme nos revela, com critério e emoção, é a força do amor paterno – e também a força do amor materno – capaz de aflorar em cada um de nós, quando nos dispomos a cultivar os valores familiares que nos movem. Quando compreendemos que o nosso legado não será medido pelo que nos tornamos ou acumulamos, mas pela contribuição que fomos capazes de dar para o futuro dos nossos filhos.

Resenha crítica do filme Kramer vs. Kramer

Ano de produção: 1979
Direção: Robert Benton
Roteiro: Robert Benton
Elenco: Dustin Hoffman, Meryl Streep, Justin Henry, Jane Alexander, Howard Duff, George Coe, JoBeth Williams, Bill Moor, Howlard Chamberlain, Jack Ramage, Jess Osuna e Ellen Parker

Comentários

  1. Gostaria de assistir.....

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    1. Assisti outro dia. Estava na grade de programação do TeleCine.

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