Melhor É Impossível: personagens com trajetórias previsíveis
Melhor É Impossível: direção de James L. Brooks
CINEMA COM SOTAQUE DE SITCOM
Tenho preguiça de assistir a certos filmes. Ludy já me disse que não se trata de preguiça: é rabugice, mesmo! Minha mulher acha que me apego a certos preconceitos e me empanturro de impaciência, até não deixar espaço para as novidades. Talvez seja verdade. Mas no caso de Melhor É Impossível, filme de 1997 dirigido por James L. Brooks, o que me fez evitá-lo por anos foi a montanha de outros filmes mais atraentes que encontrei pelo caminho e o eclipsaram. O empurraram lá para o final da lista. Até outro dia, quando Ludy encontrou o filme no serviço de streaming e avisou:– Pronto! É esse que vamos assistir!
Imediatamente me lembrei do motivo de tanta preguiça: a foto promocional com a estampa cínica de Jack Nicholson e um cãozinho nos braços, a curta explicação de que ele interpreta um escritor nova-iorquino antissocial e repugnante, a reputação de James L. Brooks como diretor e roteirista de séries de sucesso para a TV – é o nome por trás de Os Simpsons – e a presença de uma Helen Hunt com brilho contido, isso tudo me fez exercitar a dedução lógica. Intuí todo o enredo!
Para começo de conversa, teria que encarar um daqueles filmes com forte sotaque de sitcom – se escutasse as risadinhas da claque pontuando cada uma das piadas, sairia da sala! Não tenho nada contra as tais situation comedy, que os britânicos inventaram e exportaram para o mundo inteiro. Elas seguem um formato rígido, com uma estrutura narrativa testada à exaustão e replicada em cada episódio. A questão é que a construção dos personagens e o desenrolar da trama são inteiramente ancorados nas linhas de diálogo. O texto impera, o que é apropriado para uma abordagem episódica, mas para um longa, que precisa combinar exposição e ação em passagens audiovisuais, pode ser um problema. É claro que James L. Brooks tem experiência de sobra e se decidiu se aventurar no cinema, é porque tem um belo texto escondido na manga!
A presença de Jack Nicholson também diz muito. Que outro ator poderia interpretar um sujeito abjeto, inconveniente e grosseiro sem ser detestável? Quem mais poderia conquistar a empatia do espectador depois de vomitar um monte de blasfêmias politicamente incorretas? Bem, a dedução lógica é que o arco de transformação do personagem já estará estabelecido desde o momento em que ele aparecer em cena: no final estará redimido de todos os seus excessos e curado de quaisquer enfermidades cognitivas. Será um escritor nova-iorquino do bem.
As grosserias politicamente incorretas que sairão da boca do personagem também são previsíveis: gags apimentadas e machistas sobre os homossexuais, os negros, os asiáticos, os latinos, os conservadores, os aristocratas, os taxistas... Toda a fauna que habita Nova Iorque e serve de alimento para um escritor pedante, lido pela elite intelectualizada e progressista, frequentadora dos points mais descolados da capital do mundo. Claro que todas as grosserias politicamente incorretas serão devidamente "corrigidas", na medida em que o personagem caminhe para a redenção.
Todas essas conclusões ficaram incrustadas na minha mente, até que finalmente assisti a Melhor É Impossível. O carisma do elenco e a precisão do texto trataram de se impor e elevaram a qualidade do filme. Estava certo sobre a maioria das minhas ilações, mas encontrei entretenimento acima da média, para minha diversão e da minha mulher. Antes de seguir, será mais prudente examinar a sinopse:
Melhor É Impossível conta a história de Melvin Udall (Jack Nicholson), o tal escritor sarcástico e desbocado que já publicou dezenas de romances de sucesso, voltados para o público feminino. Portador de transtorno obsessivo-compulsivo, ele odeia todos os vizinhos do luxuoso prédio onde mora. Odeia também os animais, os homossexuais, os negros, os germes... Só encontra espaço para alimentar suas próprias obsessões, mas frequenta um restaurante próximo, onde é atendido pela garçonete Carol Connelly (Helen Hunt), que vive para cuidar do filho com asma crônica. O cãozinho que o vemos segurar no cartaz do filme, ele simplesmente joga na lixeira! O animal pertence a Simon Bishop (Greg Kinnear) seu vizinho gay que é artista plástico e vai parar no hospital porque foi espancado por um amigo de suas modelos. Frank Sachs (Cuba Gooding Jr.) agente de Simon, convence Melvin a cuidar do cachorro. É claro que ele se afeiçoará ao vira-latas. Mais que isso, terá que interagir com os demais personagens e embarcará com eles em uma jornada de crescimento e amadurecimento.
Como apostei, Melhor É Impossível é um filme que depende inteiramente do texto para se sustentar, mas o diretor não poderia ter reunido um elenco melhor para recitá-lo. E melhor ainda, foi esperto o bastante para sair do caminho e deixar que os atores dominassem o jogo. As cenas cômicas vêm intercaladas entre as mais sentimentais – sobre a doença do filho de Carol e a relação tempestuosa entre Simon e seus pais – o que imprime um ritmo adequado para uma quase comédia dramática.
O roteiro de James L. Brooks parte de uma história escrita por Mark Andrus, mas não explora a real força dramática que ela enseja. Detém-se na previsível trajetória de transformação do protagonista. Ele passa a gostar de animais, aceitar o convívio com homossexuais e negros e, finalmente, a gostar das mulheres. Melvin continuará um desbocado, convicto de que irradia autenticidade e honestidade sempre que abre a boca para arrotar uma verdade. Porém, como sempre faz nas suas séries de TV, o diretor não transforma totalmente seus personagens, afinal, eles precisarão estar intactos para os próximos episódios.
Estava certo! Melhor É Impossível mantém forte o inconfundível sotaque de sitcom. A diferença é que temos uma luxuosa trilha sonora assinada por Hans Zimmer e atores de peso, que fazem a sessão valer a pena. Por suas atuações nesse filme, Jack Nicholson recebeu o Óscar de melhor ator e Helen Hunt o de melhor atriz – até que o brilho da moça não estava tão contido, afinal!
Ano de produção: 1997
Direção: James L. Brooks
Roteiro: Mark Andrus e James L. Brooks
Elenco: Jack Nicholson, Helen Hunt, Greg Kinnear, Cuba Gooding Jr., Skeet Ulrich, Shirley Knight, Jesse James, Yeardley Smith, Lupe Ontiveros, Bibi Osterwald, Harold Ramis, Lawrence Kasdan, Julie Benz, Shane Black, Leslie Stefanson, Tom McGowan, Brian Doyle-Murray, Jamie Kennedy, Missi Pyle, Wood Harris, Maya Rudolph e Todd Solondz
A presença de Jack Nicholson também diz muito. Que outro ator poderia interpretar um sujeito abjeto, inconveniente e grosseiro sem ser detestável? Quem mais poderia conquistar a empatia do espectador depois de vomitar um monte de blasfêmias politicamente incorretas? Bem, a dedução lógica é que o arco de transformação do personagem já estará estabelecido desde o momento em que ele aparecer em cena: no final estará redimido de todos os seus excessos e curado de quaisquer enfermidades cognitivas. Será um escritor nova-iorquino do bem.
As grosserias politicamente incorretas que sairão da boca do personagem também são previsíveis: gags apimentadas e machistas sobre os homossexuais, os negros, os asiáticos, os latinos, os conservadores, os aristocratas, os taxistas... Toda a fauna que habita Nova Iorque e serve de alimento para um escritor pedante, lido pela elite intelectualizada e progressista, frequentadora dos points mais descolados da capital do mundo. Claro que todas as grosserias politicamente incorretas serão devidamente "corrigidas", na medida em que o personagem caminhe para a redenção.
Todas essas conclusões ficaram incrustadas na minha mente, até que finalmente assisti a Melhor É Impossível. O carisma do elenco e a precisão do texto trataram de se impor e elevaram a qualidade do filme. Estava certo sobre a maioria das minhas ilações, mas encontrei entretenimento acima da média, para minha diversão e da minha mulher. Antes de seguir, será mais prudente examinar a sinopse:
Melhor É Impossível conta a história de Melvin Udall (Jack Nicholson), o tal escritor sarcástico e desbocado que já publicou dezenas de romances de sucesso, voltados para o público feminino. Portador de transtorno obsessivo-compulsivo, ele odeia todos os vizinhos do luxuoso prédio onde mora. Odeia também os animais, os homossexuais, os negros, os germes... Só encontra espaço para alimentar suas próprias obsessões, mas frequenta um restaurante próximo, onde é atendido pela garçonete Carol Connelly (Helen Hunt), que vive para cuidar do filho com asma crônica. O cãozinho que o vemos segurar no cartaz do filme, ele simplesmente joga na lixeira! O animal pertence a Simon Bishop (Greg Kinnear) seu vizinho gay que é artista plástico e vai parar no hospital porque foi espancado por um amigo de suas modelos. Frank Sachs (Cuba Gooding Jr.) agente de Simon, convence Melvin a cuidar do cachorro. É claro que ele se afeiçoará ao vira-latas. Mais que isso, terá que interagir com os demais personagens e embarcará com eles em uma jornada de crescimento e amadurecimento.
Como apostei, Melhor É Impossível é um filme que depende inteiramente do texto para se sustentar, mas o diretor não poderia ter reunido um elenco melhor para recitá-lo. E melhor ainda, foi esperto o bastante para sair do caminho e deixar que os atores dominassem o jogo. As cenas cômicas vêm intercaladas entre as mais sentimentais – sobre a doença do filho de Carol e a relação tempestuosa entre Simon e seus pais – o que imprime um ritmo adequado para uma quase comédia dramática.
O roteiro de James L. Brooks parte de uma história escrita por Mark Andrus, mas não explora a real força dramática que ela enseja. Detém-se na previsível trajetória de transformação do protagonista. Ele passa a gostar de animais, aceitar o convívio com homossexuais e negros e, finalmente, a gostar das mulheres. Melvin continuará um desbocado, convicto de que irradia autenticidade e honestidade sempre que abre a boca para arrotar uma verdade. Porém, como sempre faz nas suas séries de TV, o diretor não transforma totalmente seus personagens, afinal, eles precisarão estar intactos para os próximos episódios.
Estava certo! Melhor É Impossível mantém forte o inconfundível sotaque de sitcom. A diferença é que temos uma luxuosa trilha sonora assinada por Hans Zimmer e atores de peso, que fazem a sessão valer a pena. Por suas atuações nesse filme, Jack Nicholson recebeu o Óscar de melhor ator e Helen Hunt o de melhor atriz – até que o brilho da moça não estava tão contido, afinal!
Resenha crítica do filme Melhor É Impossível
Título original: As Good as It GetsAno de produção: 1997
Direção: James L. Brooks
Roteiro: Mark Andrus e James L. Brooks
Elenco: Jack Nicholson, Helen Hunt, Greg Kinnear, Cuba Gooding Jr., Skeet Ulrich, Shirley Knight, Jesse James, Yeardley Smith, Lupe Ontiveros, Bibi Osterwald, Harold Ramis, Lawrence Kasdan, Julie Benz, Shane Black, Leslie Stefanson, Tom McGowan, Brian Doyle-Murray, Jamie Kennedy, Missi Pyle, Wood Harris, Maya Rudolph e Todd Solondz
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