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Mostrando postagens com o rótulo Drama

O Leopardo: minissérie épica em seis episódios

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O Leopardo: direção de Tom Shankland DRAMATURGIA ITALIANA COM TEMPERO BRITÂNICO O escritor italiano Giuseppe Tomasi di Lampedusa escreveu O Leopardo , mas não viveu para testemunhar seu incrível sucesso editorial. Publicado postumamente em 1958, depois de recusado por vários editores, o romance histórico alcançou um lugar de destaque na literatura do seu país – muitos agora se referem a ele como o Guerra e Paz da Itália! O autor se inspirou na história dos seus antepassados e desenrolou uma trama épica, repleta de intrigas, romances e disputas pelo poder.           O Leopardo é um livro conciso, com apenas 384 páginas. Mas quanta literatura! As entrelinhas vêm abarrotadas de referências e imagens tão ricas que se desdobram em acontecimentos na mente do leitor. Começa em 1860, em pleno declínio dos Bourbon, quando os Camisas Vermelhas de Garibaldi invadem a Sicília para anexá-la à Itália, nos momentos cruciais do Risorgimento, o movimento que unificou os vá...

Brazil – O Filme: uma distopia inspirada em George Orwell

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Brazil - O Filme: direção de Terry Gillian QUANDO MONTY PYTHON ENCONTRA GEORGE ORWELL No Brasil do começo dos anos 1980, o humor anárquico do grupo inglês Monty Python não era popular. Poucos tiveram a oportunidade de assistir no cinema ao filme Monty Python em Busca do Cálice Sagrado . Com o advento dos videocassetes, as fitas com os programas de TV da trupe britânica apareceram nas locadoras e ajudaram a atrair espectadores para as salas de exibição, quando chegaram os filmes A Vida de Brian e Monty Python – O Sentido da Vida . Na época, poucos enxergaram a conexão entre esses títulos e Brasil – O Filme , dirigido em 1985 por Terry Gillian – aliás, uma conexão sutil e se a menciono aqui, é apenas para criar um efeito narrativo.           Acontece que Terry Gillian, o diretor, foi um dos integrantes dos Monty Python – o único americano do grupo. Como cartunista, contribuiu com as animações que permeiam os filmes da trupe, além de ter colaborado nos roteir...

O Último Duelo: uma superprodução ousada

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O Último Duelo: direção de Ridley Scott UM DRAMA, TRÊS PONTOS DE VISTA O Último Duelo , dirigido por Ridley Scott em 2021, é uma prova de que a sétima arte já não é mais a mesma. O filme tem DNA de cinemão e consumiu um orçamento polpudo, mas amargou um retumbante fracasso nas bilheterias – não arrecadou 20% do que os investidores aportaram. É um filme ruim? Longe disso! É cinema de primeira, bem realizado, com ótimas atuações e uma história envolvente. Mas o público não se dispôs a visitá-lo nas salas de exibição. Parece que, ultimamente, está mais cômodo ficar em casa e consumir as ofertas do streaming.           Produções caras viraram artigos exclusivos para poucos cineastas – os Nolans, Camerons e Villeneuves da vida – ou restritos a temáticas infantilizadas – Godzillas, Coringas, Wolverines e Deadpools... Ousadias como O Último Duelo terão que se contentar com orçamentos modestos. O fracasso financeiro do filme é algo a se lamentar, pois arrefece o í...

Jurado Nº 2: os dilemas de se fazer justiça

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Jurado No 2: direção de Clint Eastwood UM PROFUNDO RESPEITO AO DEBATE Aos 93 anos, Clint Eastwood resolve rodar um novo filme. Os cinéfilos que acompanham sua carreira esfregam as mãos, ansiosos. Conferir a proeza, que o diretor realiza com invejável lucidez, é uma reverência obrigatória. Entretanto, Jurado Nº 2 , lançado em 2024, é mais do que uma curiosidade ou um produto do oportunismo comercial. É cinema pulsante, envolvente e repleto de conteúdo para ser degustado com prazer e, sim, reverência.           Vamos direto ao ponto: Jurado Nº 2 é um drama de tribunal, confinado no espaço mental em torno de um julgamento, onde o aparato do sistema judiciário é posto à prova em sua capacidade de fazer justiça. O cinéfilo atento já deve ter remontado ao clássico 12 Homens e Uma Sentença , dirigido em 1957 por Sidney Lumet. Lá, os jurados tentam decidir o destino de um jovem acusado de assassinar o próprio pai. Onze deles o consideram culpado, mas um tem dúvida...

Dúvida: na disputa pelo poder, há mais espaço para as certeza

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Dúvida: direação de John Patrik Shanley DUELO ENTRE CINEMA E TEATRO O suporte audiovisual do cinema oferece uma experiência sensorial que tende mais para o realismo. O suporte audiovisual do teatro promove mais o fantasioso. O que vemos na tela, vem direto do mundo como o conhecemos. O que vemos no palco, precisa ser intermediado pela imaginação. É claro, isso tudo a grosso modo! Cinema e teatro são igualmente aptos a contar todo tipo de histórias, mas se valem de linguagens diferentes. Oferecem produtos culturais diferentes, ainda que compartilhem diversos recursos narrativos.           Talvez o principal ponto de interseção entre o cinema e o teatro seja o ator. Na tela ou no palco, é ele quem comanda o espetáculo – na percepção do espectador sentado na plateia, bem entendido. Os profissionais da atuação sabem, no entanto, que uma performance teatral exige recursos diversos daqueles que empregarão numa performance cinematográfica. Descer aos detalhes pode...

Caminho da Liberdade: escapando do comunismo

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Caminho da Liberdade: direção de Peter Weir UM TRIBUTO ÀS VÍTIMAS DO REGIME STALINISTA Ouvi a palavra gulag pela primeira vez quando foi pronunciada em algum telejornal no começo dos anos 1970. Tinha 12 ou 13 anos. Não atinei de imediato para o seu significado, mas passei anos crente que se tratava do nome de um arquipélago na União Soviética – culpa do escritor Aleksandr Soljenítsyn, premiado com o Nobel de Literatura depois de empreender um esforço sobre-humano para se livrar da vigilância comunista e contrabandear para o ocidente o livro mais bombástico daquela década.           Ao entrar na faculdade, descobri que a obra – um calhamaço em três volumes – conta as histórias de centenas de sobreviventes dos campos de concentração soviéticos na Sibéria, para onde eram despachados os... inimigos do povo. Jamais li Arquipélago Gulag , mas compreendi o significado trágico do seu título por meio das resenhas publicadas na imprensa: ilhas de desgraça p...

Vestígios do Dia: um clássico dos anos 1990

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Vestígios do Dia: direção de James Ivory O PRIVILÉGIO DE PODER CONSUMIR ALTA CULTURA Que serventia tem a cultura, afinal? Ela é para nos lembrar que somos mais do que bichos! Somos humanos, capazes de nos pôr em contemplação diante da existência. E como tal, alcançamos outras realidades além daquela governada pelas leis da física e da química. Para nutrir a alma, precisamos mais do que pão – ou picanha. Precisamos de cultura! Mas não daquela cultura industrial, na qual vivemos imersos desde pequenos. Aliás, o propósito dos produtos culturais, que jorram da mídia e das instituições de ensino, parece ser o de nos conduzir na direção contrária. Tentam nos arrebanhar feito gado apaziguado pelo consenso coletivista.           Se consumimos essa cultura popular é por razões utilitaristas, e também porque ela nos inicia no exercício da contemplação. Bichos não degustam vinhos, não combinam sabores, não leem poesia, não apreciam pinturas, não se arrepiam com passag...

A Corte Marcial do Navio da Revolta: ficção histórica com abordagem teatral

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A Corte Marcial do Navio da Revolta: direção de Willian Friedkin UM AUTÊNTICO DRAMA DE TRIBUNAL Eis aqui um filme que se desenrola para muito além dos seus 109 minutos de duração. Evoca tantas conexões e desdobramentos que complica a vida deste cronista com poucos parágrafos à disposição. Exige poder de síntese! Então, vamos ser objetivos: A Corte Marcial do Navio da Revolta , dirigido em 2023 por William Friedkin é um remake, mas não se baseia no filme A Nave da Revolta , dirigido em 1954 por Edward Dmytryk e estrelado por Humphrey Bogart. Na verdade, esse novo filme é uma adaptação da peça teatral escrita em 1953 por Herman Wouk, baseada no romance que ele mesmo escreveu em 1951, intitulado The Caine Mutiny Court-Martial .           Como cinéfilo atento, você deve ter arregalado os olhos ao ler o nome de William Friedkin. Sim, é ele mesmo! Trata-se do diretor que marcou os anos 1970 com sucessos como O Exorcista e Operação França . Para encerrar a carrei...

Encontros e Desencontros: emoções que se perdem na tradução

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Encontros e Desencontros: direção de Sofia Coppola NEM COMÉDIA, NEM ROMÂNTICA. ESTÁ MAIS PARA UMA PROVOCAÇÃO – Ah! Esse é aquele longa-metragem onde nada acontece! – Exclamou o cinéfilo arrependido, que eventualmente entrou na sala de cinema para assistir a Encontros e Desencontros e esperava desfrutar uma comédia romântica. Escrito e dirigido em 2003 por Sofia Coppola, o filme rendeu para a diretora o Óscar de melhor roteiro original, mas não deve ser rotulado como um exemplar tradicional do gênero. Está mais para uma provocação. É um tanto disperso, mas para quem se atreve a embarcar na sua proposta, é divertido e envolvente.           Não assisti a esse filme no cinema. Lembro que aluguei uma cópia em DVD, junto com outros três filmes que deveriam ser devolvidos na segunda-feira. Aproveitei o preço promocional que a locadora oferecia naquela sexta-feira chuvosa. É claro que acabei deixando esse filme para o domingo à noite. E assisti sozinho, já que min...

Instinto Materno: um remake redundante

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Instinto Materno: direção de Benoît Delhomme FALTOU ENFATIZAR O UNIVERSO SONORO! Se você, cinéfilo ávido por um bom thriller inspirado no estilo de Alfred Hitchcock, tropeçar no serviço de streaming com Instinto Materno , dirigido em 2024 por Benoît Delhomme, talvez fique logo tentado a dar o play. Não é para menos: as presenças de Jessica Chastain e Anne Hathaway no elenco funcionam como chamariz. Trata-se de um bom filme e recomendo que assista. Porém, para que tire melhor proveito da experiência, sugiro que considere a longa cadeia de fatos que está por trás dessa produção hollywoodiana. E ela começa... na Bélgica!           Em 2012, a escritora belga Barbara Abel, autora de vários romances policiais de sucesso, publicou seu livro Derrière la Haine (Por Trás do Ódio). O romance foi adaptado para o cinema em 2018 pelo cineasta Olivier Masset-Depasse, também belga, com o título de Duelles (Duelos). O livro ganhou mais tarde uma versão em inglês, publicad...

Era Uma Vez um Sonho: a história do vice de Donald Trump

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Era uma Vez um Sonho: direção de Ron Howard UM LAMENTO CAIPIRA Isso mesmo, leitor. O protagonista de Era uma Vez um Sonho , filme dirigido em 2020 por Ron Howard, é o mesmo J. D. Vance que se tornou vice-presidente na chapa de Donald Trump, na corrida de 2024 à Casa Branca. Personagem da cena política americana embrulhado em polêmicas e controvérsias, a simples menção do seu nome é suficiente para dissolver a isenção dos cinéfilos mais engajados. Uns torcerão o nariz e gritarão que o filme é ruim. Outros erguerão o punho, para garantir que é cinema de qualidade.           Antes de escrever sobre esse filme – para evitar os veredictos prévios decididos com o fígado – será mais prudente examinar quem é esse tal de J. D. Vance e entender a sua trajetória. Ele ficou famoso de repente, em 2016, quando publicou seu livro de memórias intitulado Hillbilly Elegy: A Memoir of Family and Culture in Crisis . Foi um grande e inesperado sucesso editorial! Além de contar ...

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